
Imagem: Redes Sociais
Em um golpe à credibilidade do sistema de licenciamento ambiental do Paraná, a engenheira ambiental Elisa Caroline Soares, de 40 anos, foi presa preventivamente na manhã de 1º de outubro em Campo Largo, na Região Metropolitana de Curitiba. Acusada de fraudar mais de 230 dispensas de licenciamento ambiental em um esquema que operou por pelo menos cinco anos, Soares é apontada como responsável pelo desmatamento ilegal de cerca de 300 mil metros quadrados de Mata Atlântica – área equivalente a 42 campos de futebol. As irregularidades expõem vulnerabilidades graves no Instituto Água e Terra (IAT), órgão estadual responsável pela fiscalização, que falhou em detectar as fraudes apesar de um sistema autodeclaratório em vigor desde 2019 e ampliado em 2024 pela Assembleia Legislativa do Paraná (Alep).
A operação da Polícia Civil do Paraná (PC-PR), deflagrada no início do mês, cumpriu sete mandados de busca e apreensão, além da prisão da engenheira. Investigadores revelaram que Soares inseria informações falsas e documentos forjados no sistema online do IAT, projetado para autorizar atividades de baixo impacto ambiental, como corte de grama ou jardinagem. No entanto, as dispensas irregulares permitiram construções de alto impacto, incluindo condomínios de luxo, decks e empreendimentos com uso de lanchas e jet-skis em áreas protegidas, como Áreas de Preservação Permanente (APP), Áreas de Preservação Ambiental (APA), reservas legais e hídricas. Em casos extremos, a suspeita utilizou nomes de pessoas falecidas para aprovar obras, declarando falsamente que se tratava apenas de “roçada” ou paisagismo.
O delegado Guilherme Dias, responsável pelo caso, detalhou o modus operandi: “Fraudavam para construir decks, condomínios de luxo, para que utilizassem lanchas e jet-ski. Diversos tipos de fraudes foram praticados por esses responsáveis técnicos como biólogos e engenheiros ambientais”. Segundo a PC-PR, clientes procuravam Soares especificamente para obter autorizações em regiões restritas, pagando cerca de R$ 8 mil por laudo fraudulento. O esquema rendeu à engenheira mais de R$ 2 milhões, enquanto os danos ambientais incluem não apenas o desmatamento massivo, mas também o descarte irregular de lixo e riscos ao abastecimento de água de Curitiba, com nascentes ameaçadas por empreendimentos irregulares.
Imagens de satélite e vistorias fiscais confirmaram as irregularidades em ao menos dois casos emblemáticos: em um terreno, declarado como mera limpeza, foi detectado o desmatamento de quatro hectares de Mata Atlântica; em outro, uma suposta poda resultou em terraplanagem de 3.800 m² com derrubada de vegetação nativa em APP. A polícia agora apura a cumplicidade de outros profissionais – incluindo biólogos e engenheiros – e se os clientes estavam cientes das fraudes. Um dos investigados foi preso em flagrante durante a operação, ampliando o escopo para uma possível rede de corrupção ambiental.
O caso ganha contornos irônicos ao analisar as redes sociais de Soares, usadas como prova no inquérito. Em postagens recentes, como uma de 17 de setembro de 2025, ela defendia vistorias técnicas para “garantir que os projetos sejam desenvolvidos de forma responsável e em conformidade com a legislação ambiental vigente, protegendo Áreas de Preservação Permanente (APP), de Preservação Ambiental (APA), Reserva Legal”. Outra publicação, de 18 de junho, alertava: “Regularize seu empreendimento com responsabilidade técnica e segurança jurídica”, enfatizando a obrigatoriedade do licenciamento para empreendimentos imobiliários no Paraná. Essas declarações contrastam drasticamente com as acusações, destacando uma hipocrisia que choca o setor ambiental.


Imagens: Redes Sociais
A defesa de Soares, representada pela advogada Darcieli Bachmann Duro, nega veementemente as irregularidades e planeja pedir a revogação da prisão preventiva. “A Elisa é uma engenheira já há bastante tempo, muito conceituada no mercado, bem atuante, responsável. Essa informação pegou a todos de surpresa […] Acreditamos na inocência dela, em razão de todo o histórico que ela tem na sua carreira”, afirmou Duro à RPC, afiliada da TV Globo no Paraná.
Especialistas criticam o sistema autodeclaratório do IAT, implementado em 2019 e expandido em 2024 pela Alep para “desburocratizar” processos de baixo potencial poluidor. Tiago Mafra, pesquisador da Universidade Federal do Paraná (UFPR), alertou: “Uma pessoa que vai construir um empreendimento de alto impacto, com desmatamento, não pode se autodeclarar isenta do licenciamento. Então, pra gente controlar isso, tem que haver um processo de fiscalização do estado invista nesse controle, para acompanhar o processo e rito do licenciamento ambiental, que é muito ambiente para a preservação do meio ambiente”. A falta de investimentos em fiscalização estadual permitiu que o esquema prosperasse por anos, levantando questionamentos sobre a negligência do Governo do Paraná em proteger recursos naturais vitais.
As investigações seguem em curso, com a PC-PR analisando documentos apreendidos para identificar mais envolvidos. O caso não apenas revela falhas sistêmicas na gestão ambiental estadual, mas também serve como alerta para a urgência de reformas que priorizem a transparência e o rigor na fiscalização, antes que mais danos irreparáveis sejam causados ao ecossistema paranaense.
